Parábola, segundo o Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, é uma “narração alegórica, na qual o conjunto de elementos evoca, por comparação, outras realidades de ordem superior”. Pois bem, este é o propósito do presente contato com o leitor.
Conta-se que lá pelas bandas de Andradas, cidade cravada nas últimas escarpas da Mantiqueira, ao sul de Minas Gerais, viveram dois amigos. Conhecidos desde a mais tenra infância, foram colegas no ensino fundamental, médio e superior. Como pode-se ver, amizade construída por longos anos, com compartilhamento de muitas experiências, confidências e sentimentos, que só uma grande amizade pode construir.
Pois bem, depois de toda esta convivência separaram-se, sendo que um foi para Belo Horizonte e outro para São Paulo, conforme de praxe a todo aquele que pretende encontrar o seu caminho. Encontros raros davam-se em períodos cada vez mais distanciados, sabendo-se que desde a última vez passaram-se já cinco anos. Leonardo, aquele que permanecera em Belo Horizonte, perdera de vista seu amigo que partira para São Paulo. Durante muito tempo não teve nem mesmo notícias, dado que ambos perderam suas raízes comuns: Andradas.
Certo dia, na Praça da Savassi, em Belo Horizonte, ao cair da tarde de uma sexta-feira, à luz de uma tulipa de chope, Leonardo assiste passando ninguém mais que seu amigo Simão. Levanta-se e vai ao seu encontro. Após um grande abraço, a manifestação da alegria do reencontro, lembranças reavivadas dos longos anos, veio-lhe a pergunta:
— Por onde andou, Simão?
— A história é muito longa, Leo. É necessário mais tempo do que o que dispomos, nesse momento.
— Simão, você não vai me deixar em branco. Quero ouvir de você alguma coisa, que venha a preencher esse espaço de memória que me ficou, desde o nosso último encontro. Diga-me, ainda que sucintamente, o que se sucedeu com você, de lá para cá.
— Ok, Leo! Conforme você sabe nunca deixei de ser motociclista. Mudo de moto, mas não mudo de Harley Davidson. Há sete anos, após participar de uma demissão incentivada, vi-me capitalizado e decidi ir à procura de algo, que sempre sonhei encontrar. Em meus sonhos e projetos, via-me casado, vivendo feliz ao lado da mulher amada, acompanhado de meus filhos, que comporiam o meu imaginário.
Decidi não ficar parado e ir à busca da mulher sonhada, pré-requisito do meu sonho. Saí com a determinação de encontrar a mulher ideal. Sendo ela a condição para a conquista de minha felicidade, entendi que valeria a pena, investir tempo e dinheiro nessa pesquisa.
Cavalgando em minha Harley, empreendi esta aventura, com os equipamentos mínimos necessários, dinheiro em conta corrente e com a determinação de encontrar o objeto de meu sonho, grávido de meu desejo. Fiz um plano de viagem, cujo caminho crítico passaria pelos estados do nordeste e norte, pelos países do norte da América do Sul, entrando pela América Central e do Norte. Exatamente de acordo com o meu plano eu executei. Do Canadá embarquei para a Europa Ocidental, percorri a Europa Oriental, atravessei a Ásia Menor, países árabes, a China, Indonésia e outros, até chegar ao Japão. Passei ainda pela Austrália, pelas Filipinas, chegando à África.
Acalantava comigo a esperança de que, tendo encontrado a mulher ideal, depois de todo o meu percurso, eu retornaria a ela e a tomaria como minha esposa.
Já faz uns seis meses que retornei ao Brasil. Por essa razão estivemos tão distantes, por esse período que se passou. Estou feliz de poder revê-lo e retomar a nossa convivência, pois, recentemente, mudei-me para Belo Horizonte, e estou trabalhando no escritório de uma grande siderúrgica.
— Tudo bem! - Diz Leo. - Mas você, Simão, contou-me toda essa história, gerou em mim uma grande expectativa ao desenrolar a sua procura, mas não concluiu o seu relato. Afinal, você encontrou a mulher ideal? Você conquistou o seu sonho?
— Sim, Leo, eu a encontrei.
— Que ótimo! Então você se casou? Está vivendo uma condição paradisíaca?!
— Não, Leo. Eu a encontrei, mas não a desposei.
— Como?! Não compreendo. Depois de tudo isso, você não se casou com ela? Caramba, Simão! Você é um cara muito estranho! Porque você não se casou com ela!? Exclama Leo, indignado.
— Posso lhe explicar Leonardo. Ela também estava à procura do homem ideal.
Depois de conversarem sobre outros temas, despediram-se, cada qual à procura de seu destino e de suas fantasias, com a promessa de se reverem, mais amiúde.
Muitos são os que têm uma visão unilateral, egocêntrica, “coisificando” o outro. Não se dão conta de seu real valor e sua importância para o outro.
Não se perguntam: — Qual será o ideal de mim mesmo? Como minha esposa me vê? Como meus filhos me veem? Como meus amigos me percebem? E meus companheiros de trabalho?
Se eu não fizer, efetivamente, tais perguntas, não obterei as respostas. Permanecerei procurando os pais, a esposa, os filhos, os amigos e os pares ideais.
Texto elaborado por Inocêncio Magela de Oliveira para a Revista Conceito em 18/01/2013.
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